sexta-feira, 3 de julho de 2015

O Economista Português
Um blog de Economia Política e de Política Económica
Luis Salgado de Matos - Junho 29, 2015

Enganaram-se todos

O critério da racionalidade levaria a que a União Europeia (UE) chegasse a acordo com a Grécia. 
Mas a racionalidade falhou: a UE agiu dominada por paixões – a Srª Merkel «perdeu a paciência com a Grécia», confessa o Frankfurter Allgemeine Zeitung. 
Por isso a UE preferiu apresentar um ultimato aos gregos: habituados como estão a que os devedores os amem do coração, os louvem com a boca ou a pena e lhes obedeçam com as mãos e a carteira, os credores enganaram-se sobre o comportamento de alguns devedores – os gregos. 
O chefe do governo de Atenas convocou um referendo e porá a votos a Srª Merkel e a política austeritária. 
A UE e o Euro vão a votos no próximo domingo. 
O resultado do referendo é imprevisível mas sabemos que os eleitores gregos partidários do Euro baixaram em poucos dias de quase três quartos do eleitorado para pouco mais de metade. 
O movimento inverter-se-á?
É duvidoso. 
O Banco Central Europeu (BCE) anunciou que continuaria a fornecer liquidez à banca grega como se não houvesse crise de liquidez – o que levou o Sr. Tsipras a declarar-se vítima de uma manobra política e a declarar o encerramento dos bancos – limitando drasticamente as notas que cada grego tem direito de levantar do multibanco. 
Isto é: prepara-se para governar com Euro ou sem Euro.
O autoritarismo dos credores, se o Sr. Tsipras ganhar o referendo, significa a verdade da velha máxima: quem tudo quer, tudo perde. A Alemanha perceberá que, tendo empurrado a Grécia para a bancarrota, nada receberá da dívida grega que acumulou. 
Nunca é bom perder a paciência, 
Se a Grécia não fosse do Euro, o FMI estaria a aconselhar os seus credores a perdoarem a parte irrecuperável da dívida e o governo a desvalorizar a moeda. 
Seria o racional. 
Não pode ser racional porque o Euro não deixa nem ajuda o suficiente.
A semana será política. 
À ortodoxia do padrão-ouro, que levou à grande crise económico-financeira dos anos 1930, a Alemanha e as elites, que a apoiam nos diferentes Estados-membros da UE, sacrificaram a integridade territorial da UE. 
O sacrifício foi decidido em princípio e, num certo sentido, é isso que conta. 
A desmontagem da UE só não se consumará se o eleitorado grego desautorizar o Sr. Tsipras. 
Daqui até lá, os credores perderam a margem de manobra. 
O que nunca tinha acontecido desde o começo do Euro. 
Só recuperarão margem de manobra se o Sr. Tsipras perder o referendo ou se, ganhando-o, os credores souberam apresentar-lhe uma proposta aceitável.
O desfecho mostra também a irrelevância dos partidos socialistas, pelo menos dos transpirenaicos: dos sociais-democratas alemães não há novas nem mandados. 
A França socialista é o sacristão da conservadora chancelarina Merkel.
Concluamos com uma palavra sobre Portugal. 
Se a Grécia sair do Euro, perderemos – proporcionalmente somos dos maiores credores daquela país – e ficaremos numa situação perigosa pois voltaremos ao primeiro lugar na linha de mira dos mercados financeiros.

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