16/07/2015 - 00:07
Credores não se entendem sobre o empréstimo ponte a Atenas.
FMI arrasa previsões europeias para a dívida grega e pede alívio “muito além” do que está em cima da mesa.
As duras condições que a zona euro impôs à Grécia para evitar a saída da moeda única têm merecido críticas da comunidade internacional, mas, para já, é do lado dos credores que o acordo ameaça ruir.
Em Bruxelas, não há maneira de se chegar a um entendimento sobre o empréstimo ponte à Grécia.
Já em Washington, o Fundo Monetário Internacional (FMI) deixa o sinal de que, sem reestruturação da dívida, não entra num terceiro resgate.
A agência Reuters teve ontem acesso a um relatório do FMI que aponta para a insustentabilidade da dívida pública grega e que frisa que é necessário um alívio além daquele que a zona euro estará disposta a conceder.
O acordo entre a Grécia e os credores estabelece que um ‘haircut' está fora de questão, deixando a porta aberta a uma eventual reestruturação através da extensão de maturidades e redução dos juros do empréstimo europeu.
Para Washington, isso não chega.
"A dramática deterioração da sustentabilidade da dívida aponta para a necessidade de um alívio na dívida numa escala muito além da que tem estado sob consideração até à data - e ao que foi proposto pelo MEE [Mecanismo de Estabilidade Europeu]", sublinha o FMI.
Num relatório divulgado no início do mês, mesmo antes do referendo grego - e cuja publicação os membros europeus do FMI tentaram impedir -, Washington já apresentava previsões para a dívida grega muito acima das projecções oficiais de Bruxelas.
Agora, o cenário é ainda mais negro: a dívida pode chegar aos 200% do PIB, uma trajectória claramente insustentável.
Perante tais previsões, a participação do FMI no terceiro resgate à Grécia fica comprometida, porque o Fundo está proibido de emprestar dinheiro a países com dívidas em trajectória insustentável.
E Washington já quebrou as regras uma vez - e correu mal - quando, em 2010, dobrou as próprias regras para participar no primeiro resgate a Atenas.
Num relatório onde faz ‘mea culpa' sobre o falhanço do primeiro programa da Grécia, publicado em 2013, o Fundo reconheceu que já em 2010 a dívida grega não apresentava sinais de ser sustentável e que, por isso, "foi acrescentada uma alínea [nas regras do FMI] segundo a qual, quando não havia alta probabilidade de a dívida ser sustentável, o elevado risco de danos colaterais a nível internacional fornecia uma justificação alternativa para acesso excepcional" ao programa de ajuda.
A instituição liderada por Christine Lagarde não está disposta a cometer agora o mesmo erro e, por isso, pressiona para que a zona euro avance rapidamente para um alívio na dívida helénica.
A questão promete gerar polémica junto dos parceiros europeus, que são nesta altura os principais credores da Grécia, depois de apenas os investidores privados terem participado na reestruturação de 2012.
De acordo com a Reuters, o relatório do FMI foi enviado em segredo para os credores ao final do dia de segunda-feira, mas os líderes da zona euro até já estariam a par das suas conclusões durante a cimeira, quando desenharam o acordo onde colocam de parte um novo ‘haircut'.
Dificuldades no empréstimo ponte para o Verão
Há problemas mais imediatos para resolver.
A Grécia vai precisar de sete mil milhões de euros só para fazer face às amortizações de Julho e um dos pontos do acordo que saiu da cimeira do euro foi um empréstimo ponte a Atenas, enquanto o terceiro resgate não chega.
Mas há vários países contra a ideia e, apesar de Atenas ter de pagar 3,5 mil milhões de euros ao BCE já na segunda-feira, não há um entendimento entre os credores sobre como se pode ajudar a economia helénica a fazer o pagamento.
Na segunda-feira, os ministros das Finanças da zona euro não conseguiram chegar a um acordo e mandataram um grupo de trabalho para estudar várias opções.
Ontem, reuniram-se os ministros dos 28 países da União Europeia e as dificuldades agravaram-se.
Os técnicos apontam como hipótese mais forte o recurso ao Mecanismo Europeu de Estabilização Financeira (MEEF), um mecanismo semelhante ao MEE, mas que diz respeito aos 28 e não apenas à zona euro.
No entanto, o vice-presidente da Comissão Europeia, Valdis Dombrovskis, reconheceu ontem que "vários Estados fora do euro levantaram objecções".
Dombrovskis não especificou quais, mas há pelo menos três: Reino Unido, Dinamarca e Suécia.
O chanceler do Tesouro britânico, George Osborne, até já disse publicamente que o Reino Unido não vai participar no empréstimo ponte e lembrou que Londres só aceitou participar no MEEF porque houve um acordo de que o mesmo não seria utilizado para resgates a países do euro.
No entanto, a Reuters avançou que não há muitas alternativas e que a Comissão pondera violar o acordo e recomendar a utilização do MEEF, mesmo contra a vontade do Reino Unido.
Uma outra hipótese poderia ser o recurso a empréstimos bilaterais de países do euro, mas até agora só França terá mostrado disponibilidade para isso e sempre com o contributo de outros Estados.
O ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, reconheceu ontem que "vai ser difícil" chegar a um entendimento sobre o empréstimo ponte.
"É o que nos vai ocupar nos próximos dias", frisou.
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