EDITORIAL
Diogo Queiroz Andrade
11 de Junho de 2018, 6:37
A cimeira de Singapura pode ser um extraordinário sucesso ou um retumbante falhanço, mas provavelmente ficará a meio caminho destas opções.
Donald Trump e Kim Jong-un vão apertar as mãos e sentar-se frente a frente.
Em pano de fundo está um jogo de xadrez que pode mudar a face da diplomacia global — ou redundar num fracasso sem precedentes para o poder de Washington.
O que esperar de um encontro entre duas figuras tão pouco fiáveis?
Provavelmente, nada de bom.
O problema destas personagens é que nada do que dizem ou fazem fica escrito na pedra: amanhã podem mudar de ideias pura e simplesmente porque a estratégia de curto prazo assim o determina.
Toda a pressão económica — e o uso de linguagem bastante agressiva — colocada por Donald Trump nos últimos meses tem tido um efeito nulo, pelo que a cimeira sinaliza uma mudança de estratégia apelativa.
Mas tudo pode ser demasiado óbvio.
Os americanos querem uma coisa muito simples: que os norte-coreanos abandonem todas as armas nucleares que possuem e destruam todo o programa nuclear.
É muito improvável que isso chegue sequer a estar em cima da mesa: é o único trunfo relevante de Kim e, mesmo que venha a estar escrito num acordo, será num cenário distante no futuro.
Isto porque os homens de Pyongyang têm três exigências que querem ver reconhecidas antes de avançarem para a desnuclearização: segurança face ao vizinho do Sul e à presença militar americana na vizinhança do paralelo 38; respeito nas relações internacionais e reconhecimento como parceiro global; prosperidade financeira, o que implica a retirada imediata das sanções sobre o regime.
Trump não quererá correr o risco de voltar de mãos a abanar, especialmente depois de ter oferecido esta cimeira a troco de nada.
Mas a recusa em preparar-se devidamente e a contínua predisposição para o exercício de vaidade colocam o Presidente americano nas mãos do líder coreano — que já mostrou o quanto entende Trump quando mandou entregar uma carta de simpatia num envelope gigante e adequado a uma encenação bem ao gosto da antiga estrela de O Aprendiz.
Por tudo isto, não vale a pena esperar por um resultado extraordinário na cimeira de Singapura: o mais certo é que esta seja uma primeira ronda inconclusiva de compromissos a definir, num calendário em aberto, de forma que nenhum dos líderes perca a face.
Mas com dois líderes que não se prestam a provas de confiança nem estabilidade, é perfeitamente possível antever o fim abrupto das negociações ou o não-cumprimento de um eventual plano.
É o risco de negociar com líderes que não inspiram confiança.
dqandrade@público.pt
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