quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Em cinco anos saíram de Portugal mais de 10 mil milhões para offshores

PEDRO CRISÓSTOMO e LUÍS VILLALOBOS 
28/04/2016 - 07:04
Só no ano em que a troika chegou a Portugal, saíram para offshores mais de 4000 milhões de euros em transferências. Finanças divulgam dados que estavam por revelar desde 2010.
Hong Kong está no topo da lista dos centros financeiros para onde vão mais transferências de Portugal PHILIPPE LOPEZ/AFP

Em apenas cinco anos, de 2010 a 2014, empresas e particulares transferiram de Portugal para offshores localizados em paraísos fiscais 10.200 milhões de euros, de acordo com estatísticas da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) a que o PÚBLICO teve acesso.

Até agora sabia-se apenas quanto tinha sido transferido em 2009 para os centros offshore e os chamados territórios de “tributação privilegiada”, mas desde 2010 que esta informação não era divulgada pelas Finanças, o que deverá agora acontecer. 
Só em 2011, o ano em que a troika chegou a Portugal, saíram para offshores mais de 4000 milhões de euros.

O número exacto das transferências ao longo dos cinco anos foi de 10.221.802.264 euros. A larga maioria deste montante foi enviado para estes territórios por empresas, um total superior a 9500 milhões de euros, enquanto os restantes 675,5 milhões foram transferidos por pessoas singulares.

Os dados foram compilados pela administração fiscal com base em informação reportada pelos bancos, ao abrigo da Declaração Modelo 38, que obriga as instituições financeiras a enviarem ao fisco, por transmissão electrónica, informação sobre estas transferências feitas por pessoas em nome individual e empresas.

























Se somarmos a estes 10.200 milhões de euros o valor referente a 2009, o único ano em relação ao qual havia dados conhecidos, o total das transferências sobe para 11 mil milhões de euros. 
Este é um valor que diz respeito às transferências de rendimentos declarados, os que são reportados pelo sector financeiro, o que significa que o valor real será sempre superior, por causa das transferências não “apanhadas” no circuito legal.

Questionado pelo PÚBLICO, o Ministério das Finanças referiu que “os valores dizem respeito às transferências realizadas, sendo posteriormente objecto de controlo e eventual investigação pela AT”.

A lista dos paraísos fiscais é extensa e os nomes repetem-se: Hong Kong, Ilhas Caimão, Emirados Árabes Unidos, Bahamas, Andorra, Panamá, Maldivas, Ilhas Virgens e tantos outros. 
Só em 2014, o último em relação ao qual há dados disponíveis, o dinheiro foi enviado para 37 paraísos fiscais. 
O ano em que houve mais transferências (2011) foi também aquele em que mais offshores aparecem na lista dos territórios de destino das transferências: foram 51.

Em 2010 foram transferidos cerca de 3000 milhões de euros. 
No ano seguinte bateu-se o recorde de 4613 milhões, mas em 2012 o valor já foi inferior a mil milhões (991 milhões). 
Em 2013 o valor voltou a subir, para 1183 milhões. 
E em 2014 o montante foi o mais baixo de todo este período, de 373,5 milhões. 
A redução deve-se sobretudo a menos transferências de empresas.

No caso das pessoas que transferiram dinheiro em nome individual, o valor também sofreu oscilações, mas manteve-se sempre entre um mínimo de 113,3 milhões de euros e 181,7 milhões. 
Em 2014, o valor destas transferências foi de 121,4 milhões. 
Houve 620 pessoas que fizeram transferências para as próprias contas em offshores e quase tantos (575) que o fizeram para outras contas.

Para o Panamá (país sede da sociedade de advogados que está no centro das revelações do caso Panama Papers, a Mossack Fonseca), as transferências totalizaram 1301 milhões de euros ao longo daqueles cinco anos.

Hong Kong, região administrativa especial da China, é o território que consecutivamente aparece no topo da lista de destino das transferências de Portugal (a excepção foi 2010, mas a partir de 2011). 
Para lá foram transferidos 2367 milhões de euros entre 2010 e 2014.

Os dados a que o PÚBLICO teve acesso não incluem as estatísticas da Zona Franca da Madeira
Isto porque, segundo as Finanças, “as competências fiscais relativas ao Centro Internacional de Negócios da Madeira são exercidas pela Região Autónoma da Madeira, através dos respectivos serviços tributários”.

“Os dados estatísticos relativos ao Centro Internacional de Negócios da Madeira, bem como a identificação das entidades que ali operam, não são assim reportados pela respectiva entidade administradora à Autoridade Tributária nacional”, justificou o Ministério das Finanças em resposta a questões enviadas pelo PÚBLICO.

O ministério liderado por Mário Centeno esclareceu que a única informação disponibilizada pela AT resulta das declarações fiscais submetidas a nível nacional, sendo apenas conhecidos “os dados relativos à despesa fiscal em IRC com origem no regime do Centro Internacional de Negócios da Madeira”.

Na reunião do Conselho de Ministros desta quinta-feira espera-se que seja discutido um conjunto de medidas legislativas relacionadas com a transparência financeira e evasão fiscal internacional.

Em 2010, quando Sérgio Vasques estava à frente da Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, foi publicado um despacho que obriga à divulgação dos dados estatísticos da Zona Franca da Madeira e dos fluxos financeiros de Portugal para paraísos fiscais. 
No site da AT foram publicados os valores referentes a 2009, mas a partir daí nada mais foi sendo divulgado, ainda que os bancos continuem a reportar esta informação à AT.

"É preciso a desagregação da informação" sobre as transações

PEDRO CRISÓSTOMO e LUÍS VILLALOBOS
28/04/2016 - 07:07
Cinco perguntas a Nuno Sampayo Ribeiro, advogado fiscal especialista na cooperação internacional para a transparência fiscal.

Nuno Sampayo Ribeiro, advogado especializado em internacionalização do sector financeiro e transparência fiscal, ex-consultor da Unidade Técnica e Apoio Orçamental (UTAO), lamenta que Portugal esteja atrasado na implementação das medidas de cooperação na luta contra os fluxos financeiros ilícitos.

Os dados oficiais mostram que entre 2010 e 2014 saíram do país 10.200 milhões de euros para offshores e territórios com tributação privilegiada. O valor surpreende-o? Porquê?
Não. 
Porque o modelo de negócio público e privado de gestão de activos, em regra, assenta numa proposta de valor baseada na utilização de jurisdições com tributação paradisíaca. Só através da desagregação da informação por tipo de activo, geografia, beneficiário efectivo se poderá aferir a idoneidade das transacções. 
As entidades públicas têm o dever de prestar essa informação aos cidadãos.

Entre os destinos mais escolhidos estão Hong-Kong, Bahamas, Emirados Árabes Unidos, Ilhas Caimão e Panamá. Porquê esta preferência?
As Bermudas foram apontadas em Abril deste ano pelo G20 entre as 15 jurisdições problemáticas. 
As restantes estão entre as que iniciaram uma trajectória de adesão a reboque à era da transparência, e após fortíssima pressão internacional. 
Devido a isto é seguro afirmar que quem optou por estas jurisdições não esteve à procura de se sujeitar aos mais exigentes padrões de cooperação em matéria de transparência fiscal e de luta contra os fluxos financeiros ilícitos. 
Recordo que a declaração do G20 relativa ao fim da era do segredo bancário é de 2 de Abril de 2009. 
E que a troca internacional de informação fiscal aumenta o risco de sujeição a severas sanções legais e reputacionais, incluindo prisão efectiva por efeito da alteração do OE 2014.

O G20 e a UE preparam medidas defensivas contra os paraísos fiscais que não cumprem os padrões internacionais. O que pode mudar sendo criada uma lista negra conjunta?
A UE anunciou que irá subsumir a actual lista europeia de paraísos fiscais por uma nova lista, a qual será respaldada por medidas defensivas para as jurisdições que recusem cumprir os padrões europeus de boa governação fiscal que são mais exigentes que os do G20. 
Por sua vez este grupo pondera o início da aplicação de medidas defensivas às jurisdições que não cumpram o padrão referente a troca de informações a pedido. 
Abre-se uma trajectória de erradicação da economia global das jurisdições não-cooperantes nestes domínios.

O que pode fazer o Governo português para aumentar a transparência fiscal em relação aos offshores?
A expressão offshore é imprecisa. 
A meu ver, Portugal deverá atribuir a mais alta prioridade política à implementação efectiva dos novos meios de cooperação europeia e global ao serviço da transparência, e em especial na promoção do comércio/investimento e na luta contra os fluxos financeiros ilícitos. 
Hoje, Portugal diz que sim, mas faz assim, assim, seremos o último país da UE a implementar a directiva da troca automática de informações. 
O prazo terminou em 1 de Janeiro de 2016. 
A FATCA [lei norte-americana para combater a evasão fiscal sobre rendimentos ganhos fora dos Estados Unidos] continua em banho-maria e já vamos no quarto despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais a prorrogar o prazo...

Que passos seguintes devem ser dados em termos de cooperação internacional nestas matérias?
No decisor público é crucial que se mobilize o mais alto nível político na agenda da transparência. 
E que traduza essa mobilização em fotos de circunstância, mas principalmente em actos através dos quais Portugal passe a figurar nos relatórios internacionais de avaliação de adesão e implementação efectiva dos padrões internacionais sobre transparência com classificação máxima. 
No imediato, Portugal deverá apoiar a proposta referente à troca automática de beneficiários efectivos. 
No decisor privado é crucial que a cultura organizacional e o modelo de corporate governance de cada empresa, em especial das bancárias, valorize verdadeiramente o controlo interno, com vista a garantir o adequado cumprimento dos objectivos de prevenção dos fluxos financeiros ilícitos. 
Nos media é decisivo identificar as audiências com o sentido civilizacional desta cooperação internacional.

Bahamas Leaks: 28 empresários portugueses identificados

PÚBLICO 
21/09/2016 - 22:01
Micael Gulbenkian, empresário na industria do petróleo, Pedro Morais Leitão, administrador da Oi, Joaquim Marques dos Santos, ex-presidente do Banif, são três dos envolvidos.
O ex-presidente do Banif, Joaquim Marques dos Santos ENRIC VIVES-RUBIO

Micael Gulbenkian, sobrinho-neto do fundador da Fundação Gulbenkian, Pedro Morais Leitão, administrador da Oi, Joaquim Marques dos Santos, ex-presidente do Banif, são três dos 28 portugueses identificados no novo pacote de documentos divulgado pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ), de que fazem parte o Expresso e a TVI.

De acordo com o Expresso, a nova fuga de informação relacionada com offshores, denominada Bahama Leaks envolveu 1,3 milhões de ficheiros, relativos a 176 mil empresas e incluem os nomes de 25 mil administradores e funcionários nomeados por essas empresas ao longo dos anos

A fuga de informação diz respeito a todas as companhias registadas nas Bahamas entre 1990 e 2016 e foi obtida pelo jornal alemão Süddeutsche Zeitung, que a partilhou com o ICIJ. 
Este acervo apenas permite saber quem são os responsáveis pela administração das offshores, e na longa lista foram identificados 28 portugueses, que surgem como administradores de 38 empresas incorporadas nas Bahamas, com registos entre 2003 e 2015.

Micael Gulbenkian, empresário na indústria de petróleo e sobrinho-neto do fundador da Fundação Calouste Gulbenkian, aparece ligado a quatro offshores de que foi administrador entre 2002 e 2006 e que pertencem à Heritage Oil & Gas, uma companhia de exploração de petróleo e gás especializada em zonas de conflito controlada por Anthony Buckingham. 
Contactado pelo Expresso, o gestor disse não haver “nenhum mistério” sobre este assunto, e que ele havia saído do grupo Heritage Oil & Gas “por não concordar com algumas coisas que por lá se passavam”.

O nome de Joaquim Marques dos Santos, que presidiu o Banif entre 2010 e 2012, e o nome do seu presidente executivo nesse mesmo período, Carlos Duarte de Almeida aparecem como administradores da Banif Forfating Company, uma offshore que chegou a ser mencionada nos registos oficiais do banco como uma empresa que fornecia “apoio adicional às operações de trade finance do grupo no continente americano”.

Já Pedro Morais Leitão, actual administrador da empresa de telecomunicações brasileira Oi, e que foi presidente da ONI em Portugal, aparece referenciado como administrador de uma empresa chamada Mare Nostrum, juntamente com um antigo administrador do Metropolitano de Lisboa, José Maria Franco O’Neill, e com um ex-administrador do grupo Cofina, Carlos Barbosa da Cruz: os documentos não revelam qual é a actividade ou o objectivo desta empresa. 
Sabe-se, apenas, que a Mare Nostrum foi incorporada nas Bahamas a 28 de Novembro de 2012.

O registo mais recente que envolve nomes portugueses é de Setembro de 2015, altura em que foi incorporada a empresa Libertagia Mondial, cujo nome aparece amplamente associado a um esquema de burla, com base em contratos de afiliação em campanhas de marketing desenvolvida na internet. 
A empresa chegou a ter actividade internacional, e o seu rosto mais visível foi o de um português chamado Rui Salvador. 
A Libertagia Mondial, foi registada em Agosto de 2014 com um único nome associado, António Ferreira, tendo em Julho de 2015 passado a ter como presidente Cristina Moreira. 
O nome de Rui Salvador não consta dos registos.

Ex-comissária europeia omitiu que era diretora de offshore nas Bahamas

PÚBLICO 
21/09/2016 - 20:31
Depois dos Panama Papers, Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação divulga ficheiros de 175 mil empresas sediadas nas Bahamas. Há 28 portugueses identificados.
Neelie Kroes foi diretora de empresa offshore na mesma altura em que era Comissária para a Concorrência SEBASTIEN PIRLET/REUTERS

A antiga comissária europeia da Concorrência Neelie Kroes foi directora de uma companhia offshore sediada nas Bahamas durante parte dos mandatos que exerceu em Bruxelas. 
Tal poderá configurar um incumprimento do Código de Conduta da Comissão Europeia, revela uma nova fuga maciça de documentos de paraísos fiscais divulgada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação.

Quatro meses e meio depois de ter divulgado mais de 11 milhões de documentos dos ficheiros da firma de advogados Mossack Fonseca, sediada no Panamá, o Consórcio e as dezenas de jornais associados lançam um novo capítulo da investigação ao mundo – conhecido mas obscuro – dos paraísos fiscais, desta vez com epicentro nas Bahamas, outro dos destinos favoritos de particulares e empresas para contornar as máquinas fiscais dos seus países de origem.

Ao todo, nesta nova ronda, adianta o jornal Le Monde, a informação refere-se a um total de 175 mil empresas offshore registadas naquele arquipélago das Caraíbas desde 1990. Os documentos permitem conhecer o nome das sociedades registadas naquele paraíso fiscal e as datas de incorporação ou dissolução dessas empresas, bem como a identidade dos seus administradores e dos seus intermediários – entre os quais, a firma Mossack Fonseca. 
No entanto, ao contrário do que aconteceu com a fuga dos Panama Papers, a informação disponível não contempla nem a actividade nem o nome dos accionistas e beneficiários das empresas offshore.

Segundo explicam os jornalistas que investigaram os documentos, a principal razão para a constituição de uma sociedade (ou um fundo ou até uma fundação) no paraíso fiscal das Bahamas é a inexistência de impostos – sobre os lucros, o rendimento ou sucessórios. 
O outro motivo é a garantia de anonimidade, apesar da existência de um registo público.

O português Expresso, outro dos parceiros do Consórcio, identificou 28 portugueses como administradores de empresas ali sediadas, numa lista que não integra políticos, “sendo os nomes mais conhecidos” os de Micael Gulbenkian, sobrinho-neto de Calouste Gulbenkian, e Pedro Morais Leitão, ligado à empresa de telecomunicações brasileira Oi.

O jornal Guardian identifica também na lista (que integra mais de 25 mil nomes) a nova ministra do Interior britânica, Amber Rudd, que surge como directora de duas empresas que ali registadas entre os anos de 1998 e 2000. 
O diário britânico revela, no entanto, não ter indícios de que Rudd, estrela em ascensão do Partido Conservador, terá cometido qualquer ilícito.

O mesmo não parece ser o caso de Kroes, que foi comissária europeia nos dois executivos chefiados pelo português Durão Barroso – entre 2004 e 2009 como responsável pela pasta da Concorrência, depois à frente da estratégia digital da Comissão. 
O que o Bahamas Leaks agora revela é que, entre 2000 e 2009, a antiga política holandesa foi também directora da Mint Holdings Limited, um veículo criado por investidores próximos da família real dos Emirados Árabes Unidos para comprar activos da petrolífera americana Enron.

No entanto, o Código de Conduta da Comissão proíbe os membros do Executivo de deterem “qualquer outra actividade profissional, remunerada ou não”, sublinham os jornais do Consórcio, acrescentando que Kroes omitiu o nome da sociedade offshore quando, cumprindo as formalidades exigidas, apresentou em 2004 a lista de empresas para as quais tinha trabalhado nos dez anos anteriores. 
Contactada pelo Consórcio, a antiga comissária, actual consultora do Bank of America e da Uber, respondeu que foi apenas “directora não executiva” da sociedade.

Outros dirigentes internacionais cujo nome aparece nas listas obtidas pelo diário alemão Süddeutsche Zeitung como directores de empresas offshore das Bahamas são o vice-presidente de Angola, Manuel Vicente; o ministro das Finanças do Canadá, Bill Morneau, ou o ex-ministro das Minas da Colômbia, Carlos Caballero Argaez.

Transferidos 1300 milhões de Portugal para offshores nas Bahamas em cinco anos

PEDRO CRISÓSTOMO 
22/09/2016 - 13:33

Bahamas surgem no pódio dos paraísos fiscais que mais atraem rendimentos oriundos de Portugal, mas outros destinos têm vindo a ser escolhidos nos últimos anos.
As Bahamas não tributam rendimentos empresariais, mais-valias e capitais NUNO FERREIRA SANTOS

Já não são o paraíso dos paraísos fiscais, mas estão lá perto. 
As Bahamas foram o terceiro território do mundo com contas offshore para onde mais dinheiro foi transferido a partir de Portugal, em termos acumulados de 2010 a 2014. 
Ao longo destes cinco anos, saíram do país para contas sediadas neste arquipélago das Caraíbas cerca de 1300 milhões de euros. 
Mais concretamente: 1.295.175.423 de euros. 
À frente, só Hong Kong e o Panamá.

Depois dos Panama Papers, outro território da América Central está no centro de novas revelações do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ), desta vez as Bahamas, ao ser divulgada informação sobre contas ali associadas desde 1990.

Uma análise aos dados compilados pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) portuguesa com base em informação reportada pelos bancos permite concluir que as Bahamas concentraram 13% do valor transferido a partir de Portugal para contas offshore de 2010 e 2014. 
Não há dados discriminados por tipo de activos transferidos por empresas e pessoas em nome individual.

As jurisdições fiscais mais usadas ao longo daquele período foram Hong Kong, o destino de 2367 milhões de euros, e o Panamá, com um valor próximo ao das Bahamas, cerca de 1301 milhões de euros.

Ao todo, saíram de Portugal para offshores 10.221 milhões de euros ao longo destes anos, num total de 59 territórios. 
E Hong Kong, Panamá e Bahamas foram os três principais destinos, concentrando quase metade do valor conhecido pela administração fiscal.

Este é o retrato tendo em conta a soma das transferências naquele período. 
Mas olhando individualmente para cada um dos anos, as Bahamas nem sempre surgem nos primeiros lugares; aparecem no topo sobretudo por causa do grande volume de rendimentos que ali colocados em 2011 (mil milhões de euros), porque entretanto destinos até então menos habituais, como os Emiratos Árabes Unidos, Uruguai, Porto Rico, Andorra, Bolívia, Guernsey ou Gibraltar.

Em 2012 e 2013, as Bahamas foram a quinta jurisdição de destino e em 2014 já surgia em 16.ª.

Os valores para ali transferidos têm oscilado bastante – houve um pico muito significativo em 2011, ano em que a crise na zona euro se agudizou, mas nos anos seguintes há uma diferença significativa. 
Veja-se a sucessão de transferências: depois de 136,6 milhões em 2010, o valor dispara para 1024 milhões em 2011, caindo depois para 69,3 milhões no ano seguinte, 61,8 milhões em 2013, voltando a cair para 2,7 milhões em 2014.

O arquipélago centro-americano é um dos paraísos conhecidos por não tributar rendimentos empresariais, mais-valias e capitais. 
Com a pressão internacional na luta pela transparência fiscal e contra os fluxos financeiros ilícitos, nomeadamente do G20, várias jurisdições começaram a aceitar mecanismos de troca de informações fiscais, mas nem sempre pondo no terreno rapidamente essas medidas. 
No caso das Bahamas, prometem implementar as primeiras medidas para a troca de informação fiscal em 2018, um ano depois de Portugal.

800 transferências

Há um dado que sobressai em relação às Bahamas comparando este paraíso fiscal com outros principais destinos. 
O número de transferências oriundas de Portugal é menor do que as que chegam a Hong Kong ou Panamá, mas o valor envolvido é proporcionalmente superior. 
As Bahamas são o país onde o valor médio por transferência é mais elevado, de 8,3 milhões cada (tendo como referência o período total de 2010 a 2014).

Ao todo, nos cinco anos, realizaram-se 824 transferências para as Bahamas, quando para Hong King houve 20.509, para o Panamá 1826 ou para os Emirados Árabes Unidos 5649.

Nos últimos anos, a única informação disponível cingia-se às estatísticas de 2009. 
Só este ano é que foi possível ter um retrato mais abrangente, mas sempre limitado, de quanto é transferido por empresas e pessoas em nome individual.

Os dados deveriam ter sido divulgados anualmente desde 2010 pelo Ministério das Finanças mas o anterior Governo não os publicou, informação que só foi revelada este ano pelo actual executivo, depois da publicação das notícias do Panama Papers.

Os dados em causa, publicados no Portal das Finanças, baseiam-se a informação comunicada pelos bancos ao fisco, ao abrigo da Declaração Modelo 38, que obriga as instituições financeiras a enviarem ao fisco, por transmissão electrónica, dados sobre estas transferências.